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Mostrando postagens de julho, 2025

O Preço de Ser Eu

F ui fiel a mim. Esta frase, que durante tantos anos carreguei como medalha, hoje me escorre pelas mãos como um metal enferrujado. Porque ser fiel a si mesmo, percebo agora, pode ser também uma forma muito sofisticada de prisão. Quando a vida ainda era um campo aberto e promissor, agarrei-me com força àquilo que julguei ser minha essência. Defendi meus gostos, minhas certezas, meus limites. Preservar meu eu me parecia um ato de coragem num mundo feito de concessões. Mas agora, quando olho para trás com os olhos da maturidade — esses olhos que não pedem licença para enxergar o que antes era invisível —, começo a suspeitar que talvez eu tenha errado a dose. É uma ironia quase poética: só quando o tempo já não nos dá tempo é que começamos a desconfiar do eu que escolhemos proteger. A frustração, então, não é apenas por aquilo que não vivemos — é pelo modo como dissemos "não" a tantas possibilidades em nome de uma integridade mal compreendida. Talvez eu devesse ter sido menos l...

O Vazio que Nos Move

Ele não chega com alarde. Nunca chegou. Desde sempre, habita um canto da casa onde morei, da rua por onde voltava sozinho, da cadeira vazia no jantar de domingo. Às vezes se esconde nas dobras do lençol, às vezes caminha ao meu lado, sem pressa, sem pedir nada — apenas presente. Chamá-lo de vazio talvez seja injusto. Ele tem olhos, embora não pisque. Tem braços, embora não abrace. Tem nome, mas nunca o diz. Crescemos juntos. Enquanto eu aprendia a caminhar, ele aprendia a se esgueirar para dentro dos meus silêncios. Quando perdi o que nunca tive, ele foi o primeiro a me dizer, sem palavras, que haveria outras perdas. E que nenhuma delas me destruiria por completo. Com o tempo, deixei de temê-lo. Descobri que ele me acompanha não para me lembrar do que falta, mas para manter vivo o desejo de procurar. Ele não é a ausência em si — é o espaço onde cabem as possibilidades. Não me empurra para frente com promessas, mas me faz mover para que o movimento não cesse. Nos dias de festa, senta-se...